sexta-feira, 22 de maio de 2009

Desventuras e um Caminho

De repente aquele sinal me acordava, tão cedo que o barulho se tornava ensurdecedor. Ecoava a sirene por dentre minha casa. Como se um tiro tivesse levado acordei. Rapidamente estiquei o braço para acabar com o maldito som. O despertador caiu para trás da cabeceira da cama e ali ficou despertando. Cachorros já latiam devido ao sinal do despertador, ainda maior, como que se a parede e a cabeceira tivessem a perfeita acústica da irritação. Já parecia que eu estava acordado à seis horas. Passaram-se apenas 45 segundos cronometrados pelos tic-tac do relógio da sala. Com raiva tentei socar o despertador para fora da fresta. Acho que estiquei demais as costas. Com uma dor insuportável que me atirou ao chão, fiquei ali, sentado, quase chorando, com aquele som estridente roendo meus tímpanos e perfurando minha conciência. Então as pálpebras pesaram. Adormeci. Até que um pássaro cantou. O desespero bateu à minha porta. Estava eu atrasado mais de 15 minutos. Levantei e como um louco me vesti adequadamente para ir na escola. Rapidamente corri até a cozinha e coloquei o café no fogo. Fui arrumar as coisas para a aula. Cadernos, livros, pastas, folhas, tudo, absolutamente tudo por cima da estante. Pensei em arrumar. Arrumar não, -"enfia tudo aí que não dá mais tempo!". E assim o fiz, percebi que uma folha partiu-se e que um livro estava com a capa em destroços dentro da mochila. Senti um forte cheiro de queimado, era o café. Ferveu. Não há mais tempo, vai ter quer ser café fervido. Peguei tudo para deliciarme com aquele café que mais parecia água-com-terra fervida. Quando debrucei-me na cadeira relaxei pela primeira vez naquele dia. Por pouco tempo. Quando peguei o açucareiro vi pela tampa entreaberta que não havia mais de uma colher de açúcar. Levantei com raiva do mundo e de tudo. Chutei um sapato que se fazia de obstáculo até a geladeira. Quando abri a porta e aquela luz dos céus com neblina gelada se fez presente na minha frente, -"Não há leite!". Será hoje café fervido sem açúcar. Parecia que meu estômago não aceitara aquele delicioso alimento. Mas o fiz aceitar. Enquanto bebia virei uma considerável dose de café no agasalho branco que vestia. Daquele jeito, impossível de sair. Abri o roupeiro e nehum outro agasalho para proteger-me do frio. Mas não era tão frio afinal! Pelo menos tive que mentir isso ao meu corpo. Quando coloquei o pé na rua, o vento frio aprofundou-se em minha pele e fez meu cérebro parar toda e qualquer atividade por cinco segundos inteiros. Para mim, a eternidade mais sofrível. Pegarei o agasalho? Não, eu aguento! E por meia hora esperei minha condução na parada. Estava claro. Minha presa não fora o suficiente para chegar à tempo de pegar o transporte necessário. Esperei o próximo. As lágrimas escorriam no meu rosto devido ao frio e ao vento. Sozinho ali. Porque aquilo? Porque haveria de estudar? Para que? Levantei resolvido a voltar para casa e acompanhar minha cama em mais uma jornada de dez consecutivas horas de sono. Mas uma luz se fazia mais e mais forte forte por entre a pesada neblina da manhã que ainda teimava em ser noite. Era meu ônibus. Embarquei. Chegando ao cobrador abri a mochila e antes de procurar lembrei-me de um fato, uma foto. A carteira em cima da cabeceira, ao lado de onde esteve o despertador. Quase chorei. Acho que o cobrador entendeu minha decepção e me deu uma força: -"Vai lá Guri! Vai estudar!". E riu com certo tom de deboche. Mas agradecido, logo deci. Ao colocar o primeiro pé ao solo senti uma leve escorregada. Exato. Nunca vi tamanho dejeto. Um cão comum não faria aquilo! Foi uma vaca! Ou pior, foi um homem! Será? Com esse nada simpático assunto em minha mente atravessei a avenida sem olhar semáforo, lados. O dia ficava cada vez pior. Só me dei conta quando caido no chão eu e mais um ciclista, ele reclamava, xingava, e eu apenas com ume dor no braço levantei. Já estava três quartos de hora atrasado e uma boa explicação teria que bolar. Ainda andei mais umas sete esquinas e deparei-me com aquele imponente portão. O abri sem fazer muito barulho. Logo fui barrado por um braço que segurou-me pela mochila. -"Que tu pensas em fazer aqui, hein muleque?!". Depois do susto, a raiva, e depois a explicação. -"Me deixa passar! O dia já raiou! E hoje eu tenho...". O que eu tenho hoje mesmo? Nada. Hoje é sábado. Aquela minha atitude desnorteada gerou em mim mesmo indignação estrondosa. Voltei para casa numa caminhada silenciosa e morta de uma hora e meia. Quando abri a porta vi aquele bilhete que só podia trazer notícias "bacanas". "Filho, sua irmã passou mal da asma. Não estou levando telefone e não sei ao certo qual hospital vou procurar atendimento. Não me espere para hoje. O caso é grave. Me deseje sorte.". Mais uma maldita preocupação para mim. Eu amo minha irmã, como seria se ... Não devo pensar nisso! Naquele resto de manhã pensei em tudo, tudo que era possível de se pensar. Até que palmas acordaram-me da minha viagem subconsciente. Cheguei ao portão e tive talvez o único momento realmente feliz do dia. Era ela. Sorrindo. Não entendi, pois viria ela de tão longe para me fazer feliz? Pior - ou melhor - , para falar comigo pela segunda ou terceira vez? Quando ela abriu a boca, ouvi apenas aquele ruído insuportável. Trrrrrrrrrrriiii fez o despertador. Levantei e em um salto pus-me em pé. Olhei para o relógio ainda com os olhos meio fechados. Estava atrasado já. Chegara então mais uma segunda-feira.

Um comentário:

Joo disse...

caara, muito bom!